domingo, 31 de agosto de 2008

As Janelas Nostálgicas da Percepção...

A tarde está mais silenciosa
Que o albatroz que perdeu a sua voz...
Vejo-me refletido na água,
Lá no fundo do meu velho poço...
O meu rosto que vejo
Era de quando eu brincava
Com o brinquedo que está caído lá em baixo...
Boiando naquela misteriosa profundidade...

Quanto tempo se passou...
Ninguém mais passa em frente
Da velha cerca de madeira...
As árvores estão muito quietas...
Algumas respiram vagarosamente,
As maiores, estão bocejando...
Enquanto as mais crianças
Já estão dormindo com os arbustos...

O Céu quer escurecer, então...
Eu devo ir para dentro de casa...
Atravessar o corredor do assoalho amolecido...
Isso faz tremular a velha impressora dos livros...
Vou ficar na janela observando o velho balanço
Que o meu pai um dia fez...

Não sou eu quem observa o balanço...
Sou a janela que, sentada no balanço, olha para mim...
Ou quem sabe, o balanço que de dentro de mim
Projeta-se no vidro embaçado da janela
Onde agora apoio a minha cabeça...
Vejo o vendaval sacudindo as árvores...
Começa a chover neste fim de tarde esverdeado...

Em outra janela de ferrolhos de bronze,
Construída com os ponteiros adiantados, já está chovendo...
Assusto-me com as medonhas e antigas trovoadas,
Vendo por entre os pinheiros a última claridade do Sol...
A chuva vai aumentando, e vão se abrindo mais janelas...

Por uma pequena janela de imbúia
Atravessa um feixe de luz violácea...
Por outra que agora é uma veneziana
Vejo o quintal de antes de eu ter nascido...
Pelo corredor de onde nunca vi aceso o abajur vermelho,
Abrem-se janelas finas e curiosamente altas,
Por uma delas está passando um muro
De tijolos de madeira que ao serem raspados
Derrubam farelos de areia colorida...

Tinha medo do que poderia haver acima do alçapão,
Também desconfiava que lá em cima do forro
Eu fosse encontrar a única passagem
Pela qual eu poderia descer
Até a antiga construção da casa
Onde meu pai a estaria construindo
Sem imaginar que um dia ele fosse me inventar...

Com tanto espanto, vejo a minha cama se deitando
Sobre um amontoado de tapetes selvosos
E se cobrindo com a cortina empoeirada
Que acabou de arrancar da janela...

Enquanto eu prefiro ficar sozinho

Colecionando válvulas do inconsciente,
Plantando mudas de lagoas vulpinas,
Meus colegas estão todos numa festa
E eu aqui explorando o porão da minha casa...
Mas quando eu voltar a ser mais velho
Irei lembrar-me de que as melhores festas
Eu as faço dentro de mim mesmo...

Aqui dentro do porão nasceram três janelas...
A grande janela de aumento
Agora já se encontra mais ampla
Que a minha paisagem de minutos atrás...
Assim, a totalidade múltipla do horizonte
Resume-se em apenas uma única e imensa célula
Sob os redemoinhos azuis da minha visão...

Sempre entendi e hoje entendo melhor
A razão dos intermináveis tubos
Que contornam a montanha dos relógios
Dessas curiosas e lindas pinturas
Que pressagiam a implosão da realidade...

O que até hoje eu não entendi
Foi como todos aqueles pianos apareceram lá...
No bosque da minha utopia...
Sendo que os lagos mais sombrios
Nunca passaram a noite com os olhos evasados...
E nenhuma porta se arriscou
A passar por debaixo daquele que,
Em sua geniosa autonomia,
Se abria e se fechava sem admitir que alguém,
Por insegurança do ego e fobia noturna,
Introduzisse-lhe no peito uma chave...

Velho Haisom... Meu nostálgico amigo
Com qual eu costumava sempre
Fabular sobre os Cedros e os Ciprestes...
Lembrar-me do que me foi ensinado
Pelos magos que se revelaram
Na imagem que se criou com esplendor
E depois se evaporou em minha consciência
É como eu procurar em meus bolsos
O livro raríssimo que eu roubei
Na biblioteca sagrada do meu último sonho...
Pois o pobre peixinho mágico
Poderia ter realizado todos os meus desejos
Se eu fosse morar junto com ele no fundo do Mar,
Ao invés de ter subtraído a sua alegria
Nos limites de um aquário
Onde jamais poderei mergulhar...

Um pouco disso eu disse a ti no escuro,
Dormindo, com um estranho olhar,
Parado, sob movimentos que não existem,
Na porta do teu quarto...
Todo o escuro a você eu disse,
Ao olhar de um dormir estranho,
Existindo em movimentos parados,
Na tua porta sem quarto...

Foi então, quando com a tua repreensão,
Que sem eu perceber acordei abismado...
Acreditando que você havia, em realidade,
O meu sonho transformado...
Lá eu havia descoberto com alguns sábios
Uma forma de revolucionar o mundo,

Eles construíram uma nova janela em minha percepção...

O idioma em que lá falávamos era outro,
Mas lá eu o compreendia com total perfeição...
Abrigado sob o núcleo do exterior da janela eu absorvia tudo...
Aquelas informações fariam de mim um gênio...
Mas foi como se o ar da consciência
Invadisse a cúpula do meu devaneio
Desfazendo a inexistência que conservava os segredos

Acesos em nobre e real incandescência...
Era o vácuo da inconsciência

Que matinha vivos os filamentos
Da minha quase conquistada verdade...

Meu Deus...
Em qual língua eu falava?
O assunto era de reveladora importância...
Mas... Em qual janela eu estava?
Lá dentro, com o futuro, presenteava o passado...
E... De qual amado amigo eu lembrava?
Preciosidade para qual já não tenho palavras...

Giuliano Fratin

sábado, 23 de agosto de 2008

Atrás do Véu da Inconsciência...

As lembranças nascem tranqüilas pelos jardins da memória
Ao complexo de suas absolutas profundezas
Expandindo horizontes que formam correntezas,
Delírios que desviam a verdade de uma voz
Aprisionada pelo olhar que se dilata em percepções
Para fundir-se na transparência existencial
Que favorece a luz da íntegra consciência...

Em partes, o paradoxo das evidências
Estende-se sobre a dimensão da imagem
Cujo ápice da transcendência evóla-se,
Pois com o reflexo da própria transmissão,
Projeta o silêncio e o contrário da visão
Em sua consecutiva totalidade...

Na certeza que lhe assegura de seu potencial,
Habita a superfície do amanhã...
Pelo universo inconsciente paira um segredo,
Uma verdade revolucionária,
E se desloca de tal evanescência uma nobre virtude
Que num instante assume inusitada forma
Desencontrando o sentido que recorta o centro ígneo
Da intencionalidade de sua efêmera intuição...

Os cogitos se renovam sob uma auto-fusão
Entre as áureas e fluídicas linhas de energia

Que magnetizam a esfera da luz psíquica,
Talvez pela permanência da sincronia cíclica
Que na sua atmosfera se multiplica aos entremeios
Para uma eterna atualização do ânimo vital...
Abstratos e imagéticos, em provável clarividência,

Propagam-se únicos no núcleo recôndito de uma flâmula
Que confirma de imediato a razão da própria existência

Dispersando-se em semelhança, porém, com distintos aspectos,
Curiosamente deslumbrantes na ascensão do ser imanente...

Percebe-se na freqüência em que divaga
A alegoria delineada na encosta do mistério
E vislumbra a proeza nos trajetos do dia posterior
Presa a presença de uma solitária paisagem...
Eternizada na sutil imensidão se transforma em pensamentos
Ávidos em substância de exata convicção
Qual essência concretiza ao lado externo do irreal...

Uma atividade do espírito eleva as chamas da união
Que mescla hierárquicas etapas revestidas de igualdade
Na precisão magnética de seu resultado
Translúcido no limiar da infinitude da vigília...
Cintilante abismo de reflexões nas margens da alma
Confunde a revelação de uma figura que se move

Na introspectiva alusão de seus movimentos
Traçando um caminho, o signo de um poder cósmico,
Com a força contida na ausência de sua improbabilidade...

Derramam-se os pensamentos sobre a ambígua compreensão
Das mutualidades existentes no interior da mesma condição
Que eleva as descobertas dando-lhe conseqüente queda
Nos degraus onde se ouvem rumores sobre a complexidade
Ao recompor o conteúdo disperso em múltiplas faces
Cada uma com determinada parte da grande vitória sideral...

Pelo desejo voraz de apreender o que se cria no infinito,
Códigos se reformulam para uma nova jornada,
Mas o fim que defronta o início se dissolve na claridade escura
Enquanto o silêncio em busca de qualquer ruído
Adentra a circunferência da gradual despedida
Reduzindo-se a cada véu que encobre o fruto de seu presságio...


Entre os altares do espaço, a nebulosa janela
Que no invisível transparece a criação da Vida,
Dilatando e ofuscando a compreensão etérea
Dos horizontes deslocados de seus longínquos extremos,
Se recria numa profundidade cristalina do Tempo,
E ao lago da Consciência evade o pensamento
Que procura na razão cósmica um lúcido e puro conceito
Para apreender, em suma, a sua verdadeira unidade...

Um segredo se fragmenta diante de um desafio
Cujo domínio desabriga a exaltação de seu intelecto
Que suspensa no espaço, onde deságuam os atalhos,
Direciona-se ao princípio para se poder investigar novamente
O caminho destinado ao fim de uma sublime inovação...
Mais intensa a que distancia-se num conflito de incompatibilidade
Pois nega ao espelho do vislumbrante momento
A continuidade de sua mágica e avançada progressão...

Giuliano Fratin